segunda-feira, julho 26, 2004

Fogo posto ou teoria da conspiração?

Toda a gente percebe que a conjugação de temperaturas anormalmente altas com ventos fortes é o rastilho que provoca os incêndios. E no entanto, do mais humilde popular ao mais directamente envolvido dos técnicos, sempre que surgem os fogos aparecem igualmente as teorias de fogo posto. Às quais, naturalmente os jornais e as televisões dão a cobertura que seria de esperar. É particularmente sintomático que o presidente do Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil tenha afirmado que "as temperaturas não justificam tudo, nomeadamente a simultaneidade de fogos em vários pontos do país. Depreende-se facilmente que se trata de fogo posto." Então mas o calor não é simultâneo em todo o país? E, pela negativa, será que os incendiários, lunáticos ou mandatados por interesses, esperam pela conjugação de temperaturas altas com ventos forte para atearem os fogos? Que o povo entrevistado para a televisão seja o primeiro a afirmar peremptoriamente que os fogos são postos, obviamente sem qualquer conhecimento da matéria, não é de estranhar. Resulta do costume nacional de ter que encontrar em todo o assunto uma teoria da conspiração. Que um responsável pela Protecção Civil aproveite essa "opinião generalizada" para, cavalgando-a, preservar o desempenho das forças que dirige face à "magnitude" do "inimigo" que enfrentam, é condenável mas não surpreendente. Que um jornal insuspeito como o público ponha essa hipótese em primeira página sem algo mais fundamentado do que esta opinião do presidente do SNBPC, é surpreendente e criticável, e é o que alimenta a "opinião generalizada" na qual tudo começa. Se há interesses por detrás  dos fogos eles devem ser claramente denunciados e isso ainda não foi feito, nem pelos responsáveis nem pelos meios de comunicação. Se há pirómanos por detrás dos fogos, então devem ser perseguidos e condenados. Tudo o que esteja para além disso são suspeições que, à força de repetição, se convertem numa teoria da conspiração. 


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