A vitória portuguesa de ontem teve concerteza para a larga maioria dos portugueses um sabor especial por ser contra os espanhóis. E Marcelo Rebelo de Sousa não foi de certeza o único a puxar de referências a Aljubarrota. Eu ouvi falar em ala dos namorados, da técnica do quadrado e daquele comentário bem mais moderno que fica como uma verdadeira imagem do país: "eles compram as empresas mas nós ganhamos no futebol". Sem dúvida irónico.
Mas o que achei mais interessante no meio de todo este fervor anti-espanhol foi a forma como do outro lado só descobri bom senso, boa educação e desportivismo. A maior parte dos adetpos anónimos entrevistados pela TV diziam quase sempre "o nosso treinador é um asno. Portugal esteve melhor. Parabéns. Agora estamos todos por Portugal". O primeiro espanhol com quem falei ao telefone no dia seguinte começou por me dar os parabéns e repetiu quase a mesma coisa. Nenhum deles falou das duas bola ao poste ou de qualquer decisão polémica do árbitro.
Não tenho dúvidas de que, se o resultado tivesse ficado ao contrário, decerto já teríamos arranajdo um belo conjunto de desculpas para desvalorizar a vitória alheia e assim minorar a nossa própria derrota. Decerto falaríamos do árbitro e de como ele teria sido sensível às pressões espanholas. Falaríamos do mau futebol dos espanhóis e do carácter fortuito da vitória, etc. De Espanha não veio nada disso. De Espanha veio apenas bom senso e desportivismo.
Por outro lado, com ou sem excesso de álcool, os ingleses não se esquecem de agradecer a hospitalidade nacional, fazem coro por Portugal nos jogos da nossa seleção e dizem que esperam ganhar nos quatros de final mas gostariam que Portugal também seguisse em frente. Isto é desportivismo, com álcool ou sem ele.
No jogo da abertura no Estádio do Dragão fiquei quase lado a lado com um grupo de franceses e francesas que obviamente não eram adeptos de Portugal nem da Grécia, mas tinham alguma simpatia pela nossa selecção (os pobres gregos parece que não conquistaram a simpatia de ninguém...). Viam o jogo com a despreocupação de quem não se envolve no resultado, é verdade, mas era em parte por isso que faziam da ocasião uma festa. Imagino que num jogo da sua selecção estejam um pouco mais tensos, mas não tenho dúvidas de que continuará a ser uma festa.
Os exemplos que o Euro trouxe até nós mostram-nos, para onde quer que olhemos, uma forma muito mais saudável de viver o futebol. A nossa realidadezinha de tricas entre clubes e dirigentes quase nos fez esquecer que existe toda uma outra forma de viver esse fenómeno social que é o pontapé da bola. Mas, mais ainda do que isso, a forma como rodeámos o embate espanhol com toda a espécie de referências a desforras históricas e a forma como os espanhóis responderam com desportivismo e elevação põe à mostra aquilo que no fundo não passa de uma demonstração de pequenez histórica a cultural da nossa parte. Aprendamos com os bons exemplos.
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