Ontem, quando alguém a meu lado folheava uma revista do «social», por um mero acaso pus-me a reparar que página após página, não conhecia nenhuma das pessoas que eram objecto das mesmas: modelos, actores ou actrizes de televisão, modistas, ex-participantes em concursos, etc. E isso levou-me a pensar neste modo original de medir a nossa sanidade social.
Recuando há não mais de um ano atrás, recordo o assombro com que detectava o meu próprio conhecimento acerca de um conjunto de gente que ocupava as páginas do «social» e à qual eu não reconhecia nenhum mérito especial para merecer essa atenção. E, em parte, esse conhecimento resultava do facto de as pessoas retratadas nesses artigos serem frequente objectos de conversa: ao almoço, no emprego, nos transportes, etc. Pareciam estar por toda a parte, impondo-se-me como se independentemente da minha vontade. Não chegaria ao ponto de considerar a sua recusa anti-social, mas não anvada longe de o ser.
Mas agora, passo os olhos por um exemplar ao acaso de uma revista do «social» e já quase não conheço ninguém. O que me deixa sinceramente empolgado. Como se as coisas assumissem o seu curso natural. É perfeitamente natural que eu não conheça uma pessoa que participou num concurso televisivo há uns meses atrás e hoje faz não sei bem o quê no mundo da moda. Esse desconhecimento faz-me sentir bem comigo próprio, tal como dantes o conhecimento que tinha de pessoas que não sabia porque razão conhecia me fazia sentir incomodado.
A nossa sanidade mental está em causa quando a nossa auto-imagem não é coerente com aquilo que somos ou com o nosso comportamento. Do mesmo modo, a nossa sanidade social está afectada quando as nossas ligações sociais, directas ou mediadas pela comunicação social, não estão de acordo com o que realmente achamos que é importante. Não está aqui subjacente nenhum juízo de valor do género «eu estou certo, o tipo que se interessa pelo ex-concorrente do Big Brother está errado». Não se trata disso. Trata-se simplesmente de manter a coerência entre aquilo (e as pessoas) que achamos importantes e aquilo (e as pessoas) com que nos ligamos socialmente. E, no meu caso, particular, descobrir que passo folhas várias de uma revista do «social» antes de descobrir alguém que eu conheça, revela, em primeiro lugar, que não conheço as pessoas que realmente não me interessa conhecer; e indicia, em segundo lugar, que tenho estado a ocupar o meu tempo social com coisas bem mais importantes do que aquelas que para mim não têm qualquer importância.
Daí que me atreva a propor este exercício de teor estatístico para avaliar a sanidade social de quem se interessa por aquilo que realmente é importante: reunir três revistas do «social», de preferência da mesma semana (tipo Caras, Vip e Nova Gente), e folheá-las anotando o número de «figuras públicas» que conhecemos. E depois repetir o exercício uns meses depois. Se esse número diminuir, e porque estamos no bom caminho.
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