Como subproduto do interessante debate sobre liberdade de expressão organizado pelo DN, eis uma ideia profícua de Pacheco Pereira:
“Em Portugal, devíamos estudar com muita atenção a censura. Com excepção da União Soviética, somos o país da Europa em que a censura durante mais tempo moldou a maneira de pensar: 48 anos sem um único dia de interregno. Na Turquia, Grécia ou Espanha, houve dias sem censura. Em Portugal foram 48 anos seguidos sem interrupções.
E os nossos coronéis tinham uma enorme sensibilidade para aquilo que era importante na censura: a autoridade. A censura prévia em Portugal cortava tudo o que pudesse ser entendido como crítica à autoridade. Há cortes da censura a críticas à maneira se vestir do Príncipe de Gales, às críticas à actuação dos árbitros. Os censores percebiam muito bem quando estava em causa aquilo a que eles chamavam o ‘desrespeito’.
O mais importante na nossa censura nem era a censura do político mas sim a censura da conflitualidade. Tínhamos uma censura em Portugal que proibia notícias de suicídios. Eram sempre ‘acidentes com armas de fogo’. As mortes e os assassinatos violentos também não existiam. Tudo aquilo que pudesse implicar uma ideia de conflito social era cortado.
Se quisermos estudar os nossos problemas de liberdade em 2006, não podemos ignorar uma tradição longuíssima de uma censura que combatia essencialmente o conflito social. Esta ideia é algo que ficou na nossa mentalidade e que tem muito a ver com o retorno do sr. Bom e do sr. Senso. Acho que este debate sobre as caricaturas a incorporou: nós temos uma enorme facilidade em integrar o sr. Bom e o sr. Senso no nosso quotidiano. O Sr. senso tem sucesso em Portugal porque nós temos uma mentalidade que não gosta do conflito. Nós não gostamos do conflito. Nós somos socialmente avessos ao conflito.”
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