Ricardo Quaresma já começou a dar nas vistas no Barcelona. Não é propriamente que seja caso para espicaçarmos o orgulho nacional, mas não deixa de ser agradável verificar que mais um jovem futebolista português se está a afirmar no espaço ocupado pelos melhores da sua profissão a nível mundial. Deve suscitar-nos o mesmo grau de satisfação que os prémios atribuídos aos nossos melhores escritores, cientistas ou artistas. Nem mais nem menos. A satisfação não deve ser maior por eles serem futebolistas, mas também não deve ser menor por isso.
Mas a emergência de mais uma estrela portuguesa nos relvados europeus suscita outra reflexão. Para mim, a facilidade e regularidade com que Portugal produz talentos futebolísticos de projecção internacional é um fenómeno para o qual ainda não ouvi uma explicação capaz. Não tem qualquer correlação com o número de habitantes, nem com o número de praticantes, e muito menos com a oferta de campos de treino e outros equipamentos de apoio. Uma explicação plausível pega na velha questão de o futebol ser o desporto típico dos países pobres. Brasil, países da América do Sul, alguns países africanos, etc. Na Europa são tradicionalmente os países mais pobres, do sul, que produzem os jogadores mais talentosos. Mas esta é uma explicação apenas parcial. Há inúmeros países no mundo tão ou mais pobres que Portugal, que não têm, nem de perto nem de longe, o mesmo número de jogadores nos principais campeonatos europeus.
Mas, independentemente da explicação, o raciocínio leva-nos quase inevitavelmente a outra reflexão: se compararmos os futebolistas de alta competição a uma mercadoria, então concluímos que Portugal é exportador de talentos futebolísticos da mesma forma que é exportador de cortiça ou vinho de qualidade. É verdade que como uma balança de transacções deficitária, importa mais do que exporta, mas com exportações de qualidade e grande valor unitário.
Pergunto então: se produzimos jogadores de qualidade, em quantidade, sem fazermos nada por isso, o que aconteceria se estimulássemos e cuidássemos devidamente desse sector exportador como fazemos (ou devíamos fazer) com os restantes? Certamente exportaríamos mais e importaríamos menos. Mais jovens talentos despontariam e seriam vendidos para Espanha ou Itália e menos brasileiros de valor duvidoso seriam importados. Mais ainda: se já hoje é presumível que uma transferência de 10 milhões de euros, como a de Quaresma, deve ter algum efeito, mesmo que mínimo, nas contas nacionais, não seria desejável multiplicar na medida do possível esse efeito? E o que dizer das transferências de emigrantes de luxo pagos a peso de ouro como Figo, Rui Costa, Fernando Couto ou Sérgio Conceição? Não terão elas já hoje um efeito que poderia ser multiplicado se exportássemos ainda mais jogadores do que exportamos?
Moral da história: não sei se o recente relatório sobre o futebol português profusamente citado pelo major Valentim Loureiro integra ou não este tipo de contabilidade e análise prospectiva, mas parece-me que, objectivamente, este podia ser um sector estratégico da nossa economia em vez de ser apenas um epifenómeno que ninguém consegue explicar cabalmente.
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