terça-feira, fevereiro 22, 2005

Naughty, naughty...

-
Pedro Santana Lopes tem este dom de fazer sempre o que é imprevisível...

Mas alguém acredita que ele fica por aqui?

O fim da Política

O debate de ontem, na RTP sobre o "Dia Seguinte" às eleições (que nome tão bem escolhido para um cataclismo...) foi morno e na maior parte do tempo previsível. Mas houve um momento em que realmente emergiu uma questão importante: foi quando um dos economistas liberais advogou, que, grosso modo, os políticos deviam limitar-se a seguir as directrizes impostas pelos indicadores económicos e respectiva interpretação feita pelo economistas, ao que o politólogo presente reagiu afirmando que isso significava o fim da política e que nesse caso as escolhas na verdade se passavam a restringir a uma só. Ou seja, em vez de poderem escolher entre vários caminhos, os políticos, mandatados pelos eleitores, limitavam-se a estar presentes para trilhar o caminho imposto pela racionalidade económica. Na altura lembrei-me de Fukuyama e do seu "O fim da história", que nesta versão bem se poderia chamar "O fim da política". Esta sim era a questão que por si só merecia um debate. A moderadora ainda tentou puxar a discussão para aqui, mas a espuma da actualidade política submergiu rapidamente a questão.
Foi pena. Porque estamos certamente perante um dos traços essenciais das sociedades modernas, da norte-americana à dinamarquesa, passando por todas as que estão no meio, incluindo a portuguesa. O primado da economia sobre a política não é alheio à descrença dos eleitores no sistema político (que, em maior ou menor grau, é um fenómero globalmente ocidental), que se expressa na abstenção; nem é alheio à emergência do neo-liberalismo um pouco por toda a parte (liberalismo e política não combinam). Este é certamente um tema capaz de alimentar a reflexão. Certamente voltarei a ele com mais vagar.

Acerca do voto em branco

Este debate acerca da importância a atribuir ao voto em branco é interessante. Os números atingidos são de facto preocupantes, mas na verdade até esperava uma maior votação em branco nesta eleição, uma vez que me parece que houve um conjunto de factores conjunturais que se juntaram às razões estruturais que estimulam o voto em branco.
A principal razão conjuntural, claro, foi o "efeito Santana" combinado com a ausência de alternativas credíveis (os socialistas eram, para muitos dos que votaram em branco, mais do mesmo). A outra razão foi a campanha - rudimentar e bastante localizada mas ainda assim uma campanha - a favor do voto em branco. Terá sido a primeira vez que este voto foi objecto de um approach positivo por parte de um grupo de pessoas, o que terá contribuido, aos olhos de alguns dos que acabaram por votar em branco, para mudar, em parte, a natureza deste voto: de essencialmente negativo para inesperada e surpreendentemente positivo. Ou seja, o voto em branco "institucionalizou-se". Deixou de ser um exotismo e passou a ser uma alternativa eleitoral (ao ponto de já alguém pedir um espaço próprio no boletim de voto!!!).
Mas, para além da conjuntura que envolveu esta eleição, há razões estruturais para o aumento gradual e sustentado do voto em branco (que como se sabe é primo - mas não irmão - da abstenção), das quais a mais importante é o distanciamento entre os eleitores e os eleitos, um fenómeno que, como se sabe, é particularmente evidente em Portugal e em relação ao qual toda a gente parece estar de acordo mas ninguém é capaz de resolver.
É verdade que o voto em branco aumentou, mas, atendendo aos "poderosos" factores conjuturais que estavam a potenciar os factores estruturais, o resultado até ficou aquém das expectativas. Se a situação se repetir no futuro, não tenho dúvidas que votação em branco será ainda mais numerosa.

segunda-feira, fevereiro 21, 2005

A recomposição de paisagem eleitoral

Para quem achava que o sistema político e partidário português já era suficientemente maduro e epifenómenos como o PRD já não eram possíveis, eis como um ciclone chamado Santana baralha tudo de novo.
Há apenas alguns meses atrás, com a maioria de coligação de Durão Barroso e a situação económica já então não pior do que está hoje, ninguém ousaria prever a absolutamente ilógica viragem à esquerda que ocorreu nestas eleições. Tão desmesurada que chega para nos pôr a pensar se será apenas ou sobretudo o voto punitivo a explicá-la.
Os resultados eleitorais vão certamente (e merecem-no sobremaneira), merecer múltiplas análises por parte dos especialistas, as quais serão naturalmente aguardadas com científica expectativa. Mas duas ou três observações parecem suficientemente claras para serem arriscadas:

1. O PPD/PSD perdeu para os socialistas provavelmente todo o centro político que tinha votado no partido em 2002. Senão todo, 90 por cento dele. Em grande parte, retomando o raciocínio dualista PPD versus PSD, provavelmente é correcto dizer que todo o eleitorado PSD votou no PS nestas eleições. Só assim se explica que, crescendo o PS até um score que manifestamente não estava ao seu alcance em nenhuma conjectura pré-eleitoral, mesmo assim todas as esquerdas tenham aumentado a votação. Só isso explica que o PCP não tenha continuado o seu caminho em direcção ao definhamento e que o Bloco tenha exponenciado a sua votação. Trata-se de um momento histórico para a esquerda, que, à falta de melhor explicação (pelo menos por enquanto) dá bem a dimensão do “fenómeno” Santana.

2. A maior parte dos votantes que o PP perdeu devem ter ido para o PSD, por paradoxal que isso possa parecer. Em primeiro lugar porque não parecem transparecer na votação dos sociais-democratas; em segundo lugar porque o PP fez uma boa campanha e pensou que o esvaziamento do PSD lhe ia dar votos à direita. Aconteceu precisamente o contrário pela simples razão de que Portas esqueceu o efeito de desilusão que sempre acompanha um partido de extremos anti-sistema quando se integra no sistema. Quando a coisa corre bem, até consegue alguns votos e vários lugares políticos para distribuir pelos seus acólitos. Mas quando a coisa corre mal, pode também ser castigado, como foi caso. E o PP foi castigado porque não pôde, por fidelidade à coligação (e ainda mais com um acordo que Portas assinou por não prever uma maioria absoluta PS), usar todos os argumentos que, hoje, em Portugal, estariam ao alcance de um pequeno partido de direita não comprometido. A Europa é o melhor exemplo.

3. Para o Bloco de Esquerda, o esvaziamento do PSD e a deslocação do PS para a direita eleitoral (ganhou milhares de votos à direita mas também perdeu bastantes à esquerda) caíram do céu: o processo de crescimento gradual deu de repente um solavanco e o BE transformou-se num partido a ter em conta em qualquer xadrez eleitoral. Para o BE nada será como dantes e o património de votos recolhidos nestas eleições pode revelar-se extremamente valioso, basicamente porque os votos dos extremos são menos volúveis do que os do centro.

4. Olhando para o quadro eleitoral dos concelhos, nota-se que o PCP perdeu três no Alentejo (já não é o partido mais votado), mas ganhou votos um pouco por todo o país, sobretudo no norte. Ou seja, diluiu uma das desvantagens da sua demografia eleitoral: a concentração regional, que, se por um lado se convertia mais facilmente em mandatos de Hondt, por outro lado limitava a notoriedade do partido a nível nacional (para usar um termo técnico de marketing) e a sua elegibilidade perante um leque muito mais vasto de eleitores.

Ou seja, as transferência de votos do PP para o PSD, do PSD para o PS, do PS para o BE, do PS para o PCP e da abstenção para todos os partidos de esquerda recompuseram, em grande parte, o quadro eleitoral nacional. As consequências imediatas são aquelas que resultaram na noite eleitoral, mas as consequências a médio prazo estão ainda por determinar. Sendo certo, no entanto, que, se é surpreendente uma tão grande movimentação de votos numa só eleição, seria ainda mais supreendente outra ou outras movimentações semelhantes nos tempos mais próximos. O que quer dizer que, onde quer que estejam hoje, muitos desses votos podem ter vindo para ficar durante algum tempo, mudando de uma forma estável a paisagem eleitoral. Mais um resultado a crédito de Santana Lopes, o coveiro da direita em Portugal.

Vejam bem o nível...

"Sócrates vai 'ejectar sangue novo' no executivo"
Jorge Coelho, na TVI, citado pelo Público

A "guerra civil" no PSD

A “guerra civil” para a qual se contam espingardas no PSD, não é uma guerra fratricida entre irmãos: é na realidade uma guerra entre dois partidos que convivem num só desde que Sá Carneiro teve o poder federador para os unir. Mas que na realidade, sob o manto de sucessivas maiorias e governos, ainda são dois.
Santana sempre se reclamou da herança espiritual do PPD e, em grande parte, a reacção anti-Santana dentro do PPD/PSD foi uma reacção dos militantes do PSD, para os quais o liberalismo económico (começado muito antes de Santana), ainda era aceitável, mas o populismo político era verdadeiramente inadmissível. A teoria da vitimização de Santana tem como objecto expresso alguns barões identificados (com Cavaco à cabeça), mas dirige-se implicitamente a todo o PSD e é o PSD que Santana pretende desafiar nas urnas do congresso. Santana sente portanto que está apenas a defender o “seu” partido. Os outros que defendam o “deles”. Que é provavelmente o que vai acontecer no Congresso.
E, podemos pasmar-nos ou não, mas Santana pode ganhar! E se Santana ganhar, alguns barões e muitos militantes vão sair do partido e, com isso, o PSD vai sair do PPD e os dois partidos que hoje convivem num só aparentemente contra-natura vão assumir a sua verdadeira natureza.
Disso não virá mal ao mundo. Ninguém disse que o sistema partidário português tinha que ter quatro partidos (como o BE prova), nem sequer apenas dois partidos à direita.
Claro que, do ponto de vista da formação de maiorias, isso não interessa nem ao PPD nem ao PSD. E por isso é que só o carácter “irracional” de Santana Lopes permitiu levar a situação até este ponto. Ninguém no seu perfeito juízo, ao longo de toda história do PPD/PSD, arriscou ou arriscaria levar a confrontação até este ponto. Mas Santana fê-lo. E agora o partido está à beira do abismo. Resta saber se vai dar o passo em frente.
Na sua imprevisibilidade, Santana é bem capaz de o fazer, e não se vê quem, do lado do PSD, possa evitar que esse passo seja dado. A não ser Cavaco, se o facto de há muito ter tomado lado nesta “guerra” não lhe tiver tirado ainda todo o capital político que ainda tinha para re-federar o partido. Daí a dramatização lançada por Pacheco Pereira, claramente um apelo a Cavaco para “salvar” o partido. Porque Pacheco Pereira há muito que percebeu o que está em causa (aliás, se não estou em erro, foi o primeiro a fazê-lo).
Se Cavaco avançar para a Presidência e for ao congresso apoiar o “seu” candidato a presidente do partido, talvez Santana não consiga os míseros dois ou três apoios que considerará suficientes para iniciar mais uma corrida suicida, agora para Belém. Se Cavaco for ao congresso, mas ainda assim alguns delegados não lhe perdoarem as patifarias que tem feito ao partido, Santana avança na mesma. Se Cavaco faltar ao congresso (pessoalmente ou por interposta pessoa: Marques Mendes, PP, Ferreira Leite?), então o caminho fica aberto para Santana e todos os outros “baronetes” serão impotentes para o travar.
O que significa que podemos muito bem ter dois candidatos de centro-direita nas próxima presidenciais. Santana sempre o quis e agora quere-lo ainda mais por sentimento de vingança em relação a Cavaco, que considera o grande responsável pela débacle de ontem. Cavaco, se o quiser, sabe que mesmo assim pode ganhar facilmente ao agonizante Santana uma passagem à segunda volta e, de forma mais renhida, pode ganhar a Guterres a ronda final. Mas, do ponto de vista partidário, uma tal divisão entre o PPD e o PSD dificilmente aconteceria sem deixar marcas: ou a separação pura e simples entre ambos, ou o desaparecimento por longos anos da facção perdedora, recatada a lamber as feridas abertas na luta.

Primeiras notas sobre uma hecatombe eleitoral

Isto foi de facto uma hecatombe. Ainda a quente, uma mão-cheia de observações:

1. A dimensão da vitória do PS deve ter surpreendido o próprio PS. Claro que em números tão grandes tem que haver mais do que mero voto punitivo. Mas é inegável que o Poder “caiu nos braços” do PS sem que Sócrates verdadeiramente tenha feito algo para o merecer. Resta a “esperança” de que Sócrates tanto gosta de falar e a “responsabilidade” que agora lhe cai nos ombros. Oxalá esteja à altura.

2. Interiormente e secretamente, Louça deve ter respirado fundo quando viu que o PS tinha maioria absoluta e que o BE tinha a expansão que teve. Assim o partido cresce, “desurbaniza-se” e continua a não se comprometer. Aliás, isso mesmo Louça tornou claro na sua declaração, na qual marcou agressivamente o espaço à esquerda do PS.

3. O crescimento do PCP não é mais do que um “balão de oxigénio”. Mal seria se, perante uma tal hecatombe da direita e uma tão grande viragem à esquerda, o PCP continuasse a perder votos. Mas este resultado pode ser também um “balão de oxigénio” para Jerónimo de Sousa usar como capital, a juntar à sua evidente simpatia pessoal, para rejuvenescer e dinamizar o partido, sob pena de ser ultrapassado pelo BE na próxima eleição. Se é que não o começou já a fazer, a avaliar pelas figuras desconhecidas (e num caso claramente abaixo dos 40…) que o secundavam no discurso da noite eleitoral.

4. Serão verdadeiras as lágrimas de Paulo Portas? Depois de já o termos visto em Santana e em Sampaio, estará toda a política portuguesa tomada pela esquizofrenia?

5. Paulo portas saiu com dignidade. Saberemos no futuro se com segundas ou com terceiras intenções, mas o acto de saída merece aplausos, como muitos dos seus actos políticos dos anos mais recentes.

6. O discurso de Sócrates, à beira de ser indigitado primeiro-ministro de um país cheio de problemas, foi quase inteiramente virado para dentro do partido. Mais um indicador preocupante de que este homem está longe de saber de que o país precisa. Como ele próprio diria: “haja esperança…”

7. Como bem notou Miguel Sousa Tavares, atrás de Sócrates seguiam, “como lapas”, algumas das mais odiosas figuras da história recente do partido socialista.

domingo, fevereiro 20, 2005

Reflexões de um eleitor III

O célebre "centrão" estatístico tem uma existância tão real como o "esquerdão" ou o "direitão". Na verdade, as opções políticas dos eleitores são bastante mais diversificadas e, quando muito, se essas categorias ainda forem válidas, formam um continuum entre a esquerda e a direita.
Em considero-me parte do "esquerdão". Posso votar em qualquer matiz de esquerda ou mesmo numa matiz de direita social-democrata, em função do entendimento que em determinado momento faço da realidade política e das propostas dos vários partidos.
Nesta eleição só o PP e o BE apresentaram propostas políticas claras e só o segundo é de esquerda. Sócrates e Santana estiveram ambos muito aquém do que se espera de um homem que propõe liderar um país e os dois partidos "de governo" falharam redondamente em apresentar porpostas credíveis ou sequer um rumo político claro. Por isso, não votar em nenhum deles é ser exigente com eles. Pelo inverso, votar em qualquer deles apesar da ausência de ideias ou propostas é baixar o nosso grau de exigência enquanto eleitores. E aceitar baixar o nosso graubde exigência é a melhor forma de garantir que as porpostas políticas continuam por baixo.
Por outro lado, as propostas políticas do BE, elogiáveis em si mesmas, são em grande parte utópicas num quadro de consolidação orçamental e de integração europeia. E não vale dizer que o BE não será governo: em primeiro lugar porque, não o sendo, o pode influenciar; em segundo lugar porque votar BE porque o BE não será governo é, isso sim, uma forma de "desresponsabilização do voto".
Resta portanto o voto em branco. Entendido não como uma forma de desresponsabilização. Nem sequer como uma forma de alerta para a incapacidade das forças políticas de se ligarem com os eleitores. Nem sequer ainda como forma de punição dos maus políticos que temos (e de que esta eleição foi paradigmática). Resta o voto em branco como forma de preservar o nosso grau de exigência no momento escolher quem nos governa. Se nenhuma das propostas corresponde àquilo que consideramos o mínimo exigível a um candidato ou a um programa, então o melhor mesmo é votarmos, em consciência, como reflexo disso mesmo: se nenhuma das propostas políticas merece o meu voto, então nenhuma o terá. O resultado colectivo desta eleição será o que será; o meu voto é o o que é: um voto, em consciência.

Reflexões de um eleitor II

Duas semelhanças entre o voto no BE e o voto em branco são (ainda nesta eleição...) a sua natureza "contra o sistema" e o modo como permitem a quem vota uma certa "desresponsabilização" da decisão colectiva. Quem vota no BE ou em branco sabe (sabia...?) que essa é (era) a melhor forma que poder dizer "não fui eu que os escolhi" acerca da mais do que previsível má governação que resultar das eleições.
O que coloca a questão dos níveis de responsabilização do voto. Eu sou apenas responsável pelo meu voto ou sou também responsável pelo sentido final da eleição independentemente do meu voto? Quem concordar com a segunda afirmação terá tendência a considerar o voto útil. Quem concordar com a primeira vota só segundo a sua consciência e tem uma forte tentação de se desresponsabilizar pelo voto em partidos dos extremos ou em branco (que é o cúmulo do extremismo político).
Neste momento concordo mais com a primeira do que com a segunda. É abusivo imputar a um eleitor qualquer tipo de responsabilidade pelo resultado final de uma eleição. O resultado final de umaa eleição é uma responsabilidade colectiva, nunca uma responsabilidade individual. Por isso, o apelo ao "voto útil" é uma forma de pressão desonesta sobre o eleitor. Cada um deve votar segundo aquilo que acha melhor, independentemente do efeito que acha que o seu voto pode ter ou não ter na decisão colectiva.
Claro que isto também pode ser visto como um raciocínio apologético para quem se prepara para votar "desresponsabilizadamente". Mas a verdade é que o inverso não funciona: se um eleitor decidir alinhar o seu voto em função da sua "utilidade", a verdade é que, não conhecendo antecipadamente os votos dos restantes eleitores, não pode realmente conhecer o efeito do seu voto. E portanto esse será sempre um voto no escuro. Cada eleitor deve votar em função da sua consciência e só em função dela; nunca em função da sua "utilidade" para o resultado final colectivo. Compete ao sistema eleitoral e ao sistema político conseguir gerar as soluções de governabilidade a partir dos resultados eleitorais (dos 25 Estados europeus, apenas 5 vivem com maiorias de um só partido). Se algum desses sistemas não conseguir gerar essas soluções, compete aos partidos propor alterações legsilativas na próxima eleição e compete ao eleitor votar nelas.

sexta-feira, fevereiro 18, 2005

Reflexões de um eleitor I

Antecipo em um dia o período de reflexão, para dar conta da perplexidade com que encaro estas eleições e que não duvido seja partilhada por uma grande parte dos portugueses. Volto e revolto e só me ocorrem razões para não votar PS, para não votar PSD, para não votar BE, para não votar PCP, para não votar PP, para não votar em branco e para não me abster.

A primeira é a mais fácil. Não votar está para a cidadania como não dar de comer ao filho está para a paternidade. É absolutamente impensável e se não fosse um atentado à liberdade devia ser proibido.

Votar em Santana é contrário às regras do bom senso para todas as pessoas cujo o senso não esteja toldado pela clubite partidária. Como eu não sofro de nenhuma clubite que não seja desportiva, e "este" PSD está longe da social-democracia que eu admiro, votar no PSD está fora de causa.

O Partido Popular é politicamente admirável. Fez de longe a melhor comunicação de campanha, definiu muito bem o seu posicionamento político, tem um líder inteligente e carismático e juntou uma equipa de grande nível. Mas é um partido de direita. E isso significa tudo para quem é estruturalmente de esquerda. Por cada ideia do PP com a qual concordo deve haver cinco das quais discordo.

Surpreendentemente, Jerónimo de Sousa foi o melhor do PCP nesta campanha. O partido definha e não é Jerónimo que o vai salvar (os comícios do PCP parecem-se cada vez mais com um jogo de loto num lar de terceira idade), mas sempre que interveio e "teve voz", afirmou-se pela positiva, com sobriedade e elevação, com capacidade de exprimir ideias simples e verdadeiras. O problema é o essencial do qual ele é o actual acessório. O PCP já passou provavelmente o ponto de não retorno e o resultado do BE nesta eleição pode torná-lo definitivamente claro. Por isso, só vota no PCP quem... vota sempre no PCP, por "idade" ou, na falta de "idade", por "diferença". À medida que uns vão morrendo e os outros vão descobrindo o BE, o partido vai definhando, apesar de Jerónimo de Sousa.

O Bloco de Esquerda vai ser um dos vencedores da noite eleitoral, o que só surpreende quem não tem estado atento à política portuguesa nos últimos anos. O seu crescimento tem sido consistente, mas dia 20 vai dar o seu passo decisivo. Começou por ser Louçã e uns amigos, mas hoje já é bem mais do que isso (vidé Barnabé). O BE cresceu à custa do imobilismo comunista e do carisma do seu lider, mas hoje está num ponto de viragem: o que tiver que fazer com os votos que uns quantos milhares de portugueses lhes vão dar, vai determinar o seu futuro. Se os votos do BE não forem necessários para construir uma maioria de Governo, o bloco vai continuar na sua alegre, permanente e irresponsável campanha pelas bandeiras da esquerda. Se os seus votos forem necessários para fazer uma maioria, então sim, aí iremos ver de que é feito o bloco. Serão os bloquistas capazes de aceitar viabilizar uma política claramente à sua direita em troca de duas ou três bandeiras? Mais ainda, será a unidade do bloco capaz de resistir à primeira dessas coisas e à escolha das bandeiras? Acho difícil. Por isso me parece que, se for necessário para tal, o bloco pode ser para o PS um sério indutor de instabilidade governativa. Para além de perder o fascínio de anti-regime que faz parte da sua genética (e se perder isso perde uma boa parte dos votos na eleição seguinte). Tudo isto com uma agravante: as bandeiras do BE são todas bastante bonitas, mas inteiramente e seguramente incompatíveis com o equilibio das contas públicas. E, não nos tiverem estado a enganar este tempo todo, isso é "só" o mais importante nesta eleição.

Será que o Partido Socialista aprendeu com os seus próprios erros? Penso que esta vai ser a pergunta que mais vezes os eleitores vão colocar a si próprios. O PS é o único partido do espectro partidário com capacidade e possibilidade de formar um governo "a sério" e de tomar as decisões necessárias ao país, mesmo que seja governando mais à direita do que gostaria. Mas não me parece que esteja na disposição de o fazer. Foi procupante ver Sócrates prometer uma benesse diferente para cada região por onde passava o seu périplo pelo país, juntando-lhe nos debates um conjunto de ideias vagas, mas caras. Caras demais para serem compatíveis com o equilíbrio das contas públicas. Com os socialistas de volta ao poder, vai de certeza voltar o clientelismo (com os guterristas sem guterres à cabeça de uma longa fila de boys for the jobs) e, se de fora não os puserem na ordem, vai provavelmente voltar o despesismo. A única esperança do pobre povo português é que a Europa tenha mão nestes governantes e os "obrige" a governar decentemente. E isso é mais do que possível e menos do que provável, está algures entre o possível e o provável. Seja como for, um voto no PS é deste ponto de vista um mal menor: está longe de garantir um bom governo e (com Sócrates ou sem Sócrates) dificilmente teria qualquer hipótese com um PSD entregue a alguém decente, mas pode gerar um "governo" para o país e, desse ponto de vista, é um voto diferente de qualquer outro.

Com a direita moderada enredada no seu santanismo e a esquerda incapaz de refrear os seus impulsos despesistas, o voto em branco pode vir a ser um dos grandes "vencedores" desta eleição. Já toda a gente percebeu que o PS não tem mais para dar do que aquilo que nos deu Guterres e que a "associação" ao BE apenas pode servir para tornar o governo ainda mais despesista. Acresce que nenhum dos líderes dos dois principais partidos tem realmente estatura para liderar o país. Este é o lado conjuntural. Do ponto de vista estrutural é sabido que o fosso entre eleitos e eleitores, entre a classe política e a população é cada vez maior, tornando os cidadãos descrentes na política e nos políticos. Talvez este seja o momento de mostrar com votos brancos um cartão amarelo a toda a classe política sem excepção. Esse sim, seria um voto útil, se não fosse o carácter profundamente demissionário do voto branco. O voto em branco é uma espécie de abstenção activa. Realmente não serve para nada de positivo. Não afirma nenhuma solução para o país, não dá nenhum rumo ao nosso futuro colectivo. E a verdade é que com mais ou menos votos brancos, da próxima eleição vai sair um governo.

Preto no branco no cinzento

Afinal o cenário era o terceiro. O Independente publicou os documentos que justificavam a notícia do envolvimento de Sócrates no caso Freeport e, tal como lhe competia, fez o aprofundamento da matéria. Como a notícia diz que entretanto algumas peças processuais "foram dadas como desaparecidas" e a PJ continua a afirmar que o documento não faz "nem nunca fez" parte do processo, algo está por esclarecer. E ainda bem que há um processo do PS para tirar a verdade a limpo. Mas, caso não duvide da veracidade do documento, o jornal, esse fez o que lhe competia.

Derrota avassaladora

Mesmo podendo servir o PSD em vez do PS, esta notícia da TSF sobre a previsível maioria absoluta dos socialistas e o resultado historicamente baixo dos sociais-democratas deve ser um alerta para os militantes do PSD. Enganaram-se rotundamente na aprovação de Santana e vão pagar por isso nas urnas. Mas, sobretudo devem tirar uma ilacção importante para o futuro: nos dias que correm, ainda não basta ser um socialite para ganhar eleições, ainda é preciso política. Mesmo com o impulso da TV, a imagem de Sócrates está longe de ter a densidade da de Santana, mas, mesmo propondo pouco e comprometendo-se ainda menos, tem mais "política" e mais coerência política. Ganhou por falta de comparência mas ganhou. E ganhou avassaladoramente, porque o adversário também faltou avassaladoramente. A uníca questão que falta responder no Domingo à noite é se o PS tem ou não tem maioria absoluta. Louça foi sempre mansinho com Sócrates e agressivo com Santana, mas a esta hora deve estar a pensar se não terá exagerado...

Na mouche!

Curiosamente, a melhor parte da campanha de ontem de Santana Lopes foi... a mensagem de Marcelo Rebelo de Sousa (citado na TSF). O professor mandou dizer que as maiorias absolutas do PSD em 91 e 95 tinham ideias e serviam um desígnio nacional e que a maioria pedida por Sócrates não tinha ideias nem servia nenhum desígnio nacional identificável. Tem razão e acertou na mouche. Aliás - e este é o meu ponto - fez melhor "campanha" nesta simples frase do que Santana em todos os comícios em que participou.

quarta-feira, fevereiro 16, 2005

O voto em branco

A ideia do voto em branco não é uma ideia peregrina. A abstenção é uma coisa e o voto em branco é outra profundamente diferente.

Soube da existência de um movimento de apoio ao voto em branco quando vi alguns cartazes em Lisboa, mas descobri depois que já existia um site por detrás da campanha, do movimento "Um rumo para Portugal", e mesmo um blog, e que o tema tinha sido tratado num artigo do Público. Já hoje foi a Focus que lhe dedicou a capa.

O tema do voto em branco como forma de protesto contra o estado da política foi introduzido, como nos lembramos, pela "ficção" de José Saramago em "O elogio da lucidez". Acontece que estamos hoje no limiar de transformar a "ficção" em realidade. E a prova é a existência deste movimento. Em nenhum dos artigos referidos, em nenhum ponto do site, em nenhum post do blog existe um rosto por detrás da campanha, alguém quem se possa apontar intenções, assumidas ou ocultas. E no entanto há um site que explicita os princípios do movimento (razoavelmente "apolíticos"), há um blog activo e há cartazes espalhados pela cidade para promover uma causa da qual nunca se saberão os resultados. Até prova em contrário, acredito, portanto, que o que fazem, fazem-no exclusivamente em nome da ideia de que precisamos de melhores políticos e melhores políticas, de uma forma desinteressada.

Por isso pergunto: não será esta militância bem mais admirável do que qualquer militância partidária (BE e PCP incluidos)?

terça-feira, fevereiro 15, 2005

Resposta ao directo de direita

Vamos lá então abordar o incómodo dossier "Directo de Direita".

Depois da toda a polémica suscitada pelo artigo do Independente sobre o licenciamento do Freeport de Alcochete e as suspeitas da sua relação com o financiamento do Partido Socialista, convém recordar, em primeiro lugar, que também o Público fez eco da mesma notícia do mesmo dia, o que por si só desmonta a tese da "campanha" do Independente. Se houve "campanha" ela foi "a montante" do Independente. É verdade que o Público não deu à notícia o destaque que o Independente lhe deu, mas é precisamente por isso que o Público é o Público e o Independente é o Independente. Não há nada de estranho em um dar a notícia no corpo do jornal sem chamada de capa e sem acicatar polémica e o outro dar toda a primeira página ao assunto com laivos de escândalo. Isso tem a ver com a natureza de um e de outro e é por isso que eu sou regularmente leitor de um e apenas esporadicamente leitor do outro. Ou seja, agrada-me que ambos existam.

No artigo do Independente afirma-se:
"Um documento da PJ a que tivemos acesso explica: 'As diligências efectuadas (no inquérito) permitiram apurar a existência de fortes indícios de que a alteração da Zona de Protecção Especial do Estuário do Tejo (ZPE), pelo então ministro do ambiente, teve como contrapartida o financiamento de campanhas eleitorais'".

No dia seguinte e nas ondas de choque desta notícia, um comunicado da PJ afirmou:
"Dos elementos que foram carreados para o processo não ressaltam, por ora, indícios que apontem como arguido qualquer líder partidário".

Quase em simultâneo a PGR também veio esclarecer o seguinte:
"Tanto quanto os elementos indiciários reunidos até ao momento permitem avaliar, não existe nenhuma suspeita de cometimento por parte do Engº José Sócrates de qualquer ilícito criminal relacionado com o aludido processo de licenciamento."

Ora, chegados ao cerne da questão, parece existir uma contradição evidente entre estes dois comunicados e a citação directa de um documento feita pelo artigo do Independente.

Primeiro cenário
Se o referido documento não existe e o jornalista ou o jornal se limitaram a inventá-lo, então devia haver uma forma de os processar criminalmente por aquilo que não é mais do que uma fraude. E, nesse caso, a fraude pode ter objectivos comerciais ou políticos: se forem políticos, então têm razão todos aqueles que disseram e escreveram que estávamos perante uma "campanha".

Segundo cenário
Se o documento, sendo falso, existe e foi fornecido ao Independente, então o jornal esteve mal porque não verificou esta "fonte" e devia tê-lo feito. Prestou portanto um mau serviço jornalístico e é bom que os leitores de jornais o saibam. Mas não foi agente de nenhuma "campanha". Terá sido quando muito o seu veículo.
Outro lado da mesma questão: se alguém forneceu um documento falso ao jornal na expectativa que ele desse o resultado que efectivamente deu (transformando-se em notícia), então é esse alguém é de facto o agente de uma "campanha" com fins políticos. Não é o jornal.
E, ludibriado e manietado por esta fonte, o jornal não se deve sentir obrigado a preservar o seu anonimato. A protecção das fontes não é uma obrigação, é um direito. E, como tal, deve ser exercido quando é necessário, não deve ser exercido quando não é necessário e, manifestamente, deve não ser exercido quando o seu exercício é prejudicial ao apuramento da verdade (do caso e das manobras à sua volta). Não sei se esta opinião é concordante com o Código Deontológico ou com a Lei, mas parece-me do mais elementar bom-senso. Obviamente, devia haver (o que não quer dizer que haja), também neste cenário, uma forma de sancionar o comportamento desonesto dos agentes de uma tal "campanha".

Terceiro cenário
Se o documento existir de facto e não for falso, isso significa que uma entidade policial (ou dois serviços dessa mesma entidade) emitiu dois paraceres contrários sobre a mesma matéria. Isso está longe de ser impossível ou mesmo raro. Basta pensarmos nas ligações porosas que tantas vezes se estabelecem entre agentes da polícia, aos mais diversos níveis da hierarquia, e jornalistas (e mesmo tendo em atenção que, aqui, estamos a falar de um "documento"). Neste caso, compete ao jornal obviamente preservar o anonimato da sua fonte, mas impende sobre ele o dever de confirmar a história (e eventualmente aprofundá-la).


Ou seja:

Perante uma tão óbvia contradição entre versões de uma mesma história, estamos todos certamente expectantes sobre o que a próxima edição do Independente terá para "dizer" sobre esta matéria. Até porque, estivesse ela antes já mais afectada ou menos afectada, é a credibilidade do jornal que está em causa. E ignorar a questão seria o pior que a respectiva direcção poderia fazer.
Qualquer dos cenários é possível e se escolhermos um estamos certamente a especular no vazio, mas, pela, parte que me toca, aposto (para usar um termo em voga) no segundo cenário mas não acredito que o jornal divulge a respectiva fonte.

Bloggers de todo o mundo, uni-vos!

Parece que os blogs não agradam muito à maior parte das empresas, seja porque desviam as pessoas do "trabalho", seja porque revelam os "segredos" da companhia. Alguns exemplos norte-americanos são citados neste artigo que descobri através da newsletter da Obercom. Também há exemplos de bons relacionamentos entre as empresas e os blogs, mas uma plataforma clara de entendimento ainda está por definir.

sexta-feira, fevereiro 11, 2005

Um dia gostaria de me explicar assim...

António Lobo Antunes na Visão, citado pela Aba de Heisenberg:

“Nunca colecionei nada, nunca juntei papéis, nunca guardei manuscritos: vivo do vento. Não tenho cartão multibanco, nem cartão dourado, nem cartão de visita: trago o dinheiro no bolso como os negociantes de gado e os intermediários da droga. Não me importa o que visto ou o que como, nunca bebi, não vou a jantares, e devo ser aborrecidíssimo porque não me aborreço. Em criança brincava quase sempre sózinho: continuo a brincar sózinho dentro da minha cabeça, assistindo às coisas que se fazem e desfazem continuamente nela. Não faço parte de nenhuma associação, nenhum movimento, nenhuma confraria, nenhum partido. Quase não falo e, em regra, quase não oiço. Gosto de algumas pessoas, de alguns lugares, de alguns livros. Não odeio ninguém, não invejo ninguém; não por ser bom rapaz mas por não ter tempo. Escrever é um acto que raramente associo ao prazer e que, no entanto, me leva a maior parte das horas: desconheço a razão de ser um homem de palavrinhas, colocando-as umas atrás das outras numa furiosa e mansa paciência obstinada. E não tenho mais nada a dizer a meu respeito.”

Directo de direita

Depois de meses seguidos a encaixar jabs, finalmente um directo de direita.

Não entendo muito bem a indignação causada por esta notícia do Independente depois de tantas especulações entre algumas notícias sobre os desvarios de Santana Lopes. A matéria do Independente está bem fundamentada, cita documentos a que o jornal teve acesso e tem mais credibilidade do que 80 por cento do que nos últimos meses se publicou sobre PSL. Claro que timing é suspeito, mas a notícia não deixa de ser aquilo que é. E, para mais, independentemente dos actores, corresponde a um "filme" de que já todos conhecíamos o enredo: ser partido de poder, hoje, em Portugal, é gerir uma variedade de clientelismos; este é apenas um deles. A suspeita recai sobre o PS mas podia (e pode!) recair sobre o PSD. A troca de favores políticos por apoios financeiros é como a corrupção dos árbitros de futebol: toda a gente sabe que existe; há mesmo quem saiba como e onde se faz; mas ainda ninguém foi condenado. Mas também isso parace estar a mudar. Pelo vistos em ambos os casos.

Uma coisa é certa. Isto nada traz de positivo à campanha. Pode servir para denegrir Sócrates, mas nada faz para elevar Santana. Por isso, a única indignção que eu entendo é a que se revolta com a forma como tudo se nivela por baixo nesta campanha e ninguém é capaz de discutir os problemas reais do país.

Neste momento, voto no branco!

quinta-feira, fevereiro 10, 2005

De "não-notícia" a "tabu"

E eis como uma "não-notícia" do Público se transforma num "tabu". É assim que se faz o "jornalismo" nos tempos que correm...

P.S.1: Esta manchete quer dizer que o DN já escolheu a sua facção pós-20 de Fevereiro?

Pacheco Pereira: analista ou político?

Há uma parte do texto de hoje de Pacheco Pereira no Público em que o analista brilhante deixa escapar o político que há em si.

É quando escreve: "Ganhar as eleições, colocando a hipótese de ter maioria absoluta, é o único objectivo aceitável para o PSD. (...)Qualquer "downgrade" deste objectivo, como tenho visto na boca de alguns jornalistas incautos, considerando 30 por cento o limiar de um razoável resultado do PSD, ignora o histórico eleitoral nos últimos 20 anos."

Estamos perante um político social-democrata a afiar as facas para a "guerra civil" (como o próprio lhe chama) posterior a 20 de Fevereiro. Se Santana obtiver um resultado acima dos 35 por cento, isso será sempre visto, por toda a gente excepto os grupos rivais dentro do PSD, como um bom resultado. A força das facções que se opõem a Santana dentro do partido depois de 20 de Fevereiro será inversamente proporcional ao resultado que este obtiver nas urnas. É por isso que há tanta gente social-democrata com a tentação de "fazer uma campanha negativa" a favor do PS. É que, caso ainda não tenham notado, a "guerra civil" já começou...

quarta-feira, fevereiro 09, 2005

Mixed Tape 5

Mais uma Mixed Tape disponível para download gratuito em http://www.mercedes-benz.com/mbcom/international/international_website/en/webspecial_library/mixed_tape_e.html

Silogismo

--
Se o volume de trabalho é inversamente proporcional às contribuições para o blog, isso significa que o blog pode ser considerado um indicador negativo de produtividade?

Se sim, então o que é que isso diz sobre a actual pujança da blogosfera?

No melhor pano cai a nódoa.

Concordo inteiramente com esta posição de Pacheco Pereira sobre o conjunto das duas "notícias" do Público sobre o alegado apoio de Cavaco a uma maioria PS. A posição de Cavaco relativa às vantagens das maiorias é conhecida (até já é histórica e foi amplamente debatida), mas deduzir daí um apoio a uma maioria PS e "cozinhá-la" até chegar à forma de uma notícia (como facilmente se percebe que o jornal fez) é abusivo, lesa a a deontologia e evoca um certo tipo de jornalismo (que põe a conjectura no lugar da informação e de que o Expresso é o melhor exemplo) que eu julgava longe das páginas do Público, que também é "o meu jornal".

segunda-feira, fevereiro 07, 2005

PS, BE ou voto em branco?

Pelo que leio, as estatísticas dão uma quantidade grande (anormalmente grande) de indecisos a uma semana e meia das eleições.
Pode ser resultado de um efeito de projecção (o meu voto também ainda está por se decidir por um dos três vértices deste triângulo), mas imagino que a maior parte desses indecisos ande à volta deste trio: PS, BE ou voto em branco (ou abstenção, que é a forma comodista de "dizer" o mesmo).
Parece-me que o PP tem o seu eleitorado mais ou menos seguro e que o PSD tem o seu eleitorado mais ou menos perdido. A questão é quanto mais eleitorado vai Santana Lopes conseguir perder daqui até às eleições, sendo que a maior parte dele irá para o PP com medo do PS e do BE.
No centro-esquerda e na esquerda, vai concerteza haver muitos eleitores a fugir do PCP e se calhar ainda mais a fugir de Santana. Esses são os que estão indecisos. O PS parece-lhes bem porque é verdadeiramente o único projecto de governo que concorre às eleições; mas parace-lhes mal porque sabem que a pandilha de Sócrates não é outra senão a de Guterres, mas sem Guterres. E, pelo que nos têm dito, o país simplesmente não está para isso e não seria capaz de aguentar mais quatro anos de "socialismo".
O Bloco foi para muitos destes eleitores uma boa alternativa no passado, basicamente porque era uma escolha irresponsável: sabia-se que nunca seria governo e portanto esse voto funcionava mais como um voto anti-sistema do que como uma verdadeira escolha. Foi isso que fez crescer o BE até ao tamanho que tem hoje. Mas nesta eleição já toda gente percebeu que a situação é diferente e o BE pode ser um dos parceiros de governo. E isso, paradoxalmente, é o que pode afastar dele muitos eleitores, nomeadamente aqueles que acham que o BE pode ser ainda mais despesista (ou indutor de despesa) que o PS. Por outro lado, a perspectiva de uma coligação (formal ou não) do PS com o BE pode de facto afastar muitos eleitores de centro pouco receptivos às medidas "fracturantes" que a influência BE teria numa coligação de esquerda.
Deste modo, alimentado pelo centro desconfiado do PS ou pela esquerda desconfiada do PS e do BE, o partido dos indecisos deve ser, nesta altura, o mais importante a seguir aos dois "grandes". Resta saber como vai ele agir no dia 20. Por ordem de probabilidades, vai mairitariamente ficar em casa ou vai ter a coragem de votar em branco, demitindo-se em qualquer dos casos de uma escolha demasiado importante para não ser traumática. Ou, segunda probabilidade, vai maioritariamente votar no PS em nome da estabilidade e da política económica de "contenção" que toda a gente diz ser necessária. Ou ainda, terceira probabilidade, vai maioritariamente distribuir os seus votos entre a abstenção, os brancos e o Bloco, impedindo o PS de ter maioria absoluta ou sequer mais votos do que a direita e baralhando completamente a situação política emergente.
Seja como for, é curioso notar o facto de o Governo emergente das eleições de dia 20 (ou, melhor dito, o arranjo eleitoral gerado e as várias configurações de poder que ele poderá suscitar) vir a resultar do voto de não mais de alguns milhares de eleitores. Isto significa a falta de uma força política forte e liderante (como foram o PSD de Cavaco e o PS de Guterres no passado) e o desencanto dos eleitores com as propostas de esquerda e de direita: nem de um lado nem do outro vêm propostas capazes de galvanizar o eleitorado. E isso fica a débito dos partidos e das suas lideranças.

Porque Sócrates devia afastar Guterres.

Sócrates devia perceber que a pior coisa que lhe pode acontecer nesta campanha é ter ao lado gente como António Guterres. Sem desprimor para Guterres. A observação é estritamente política. Se houve momento do debate em que Santana conseguiu encaixar um "gancho" em Sócrates, foi quando o acusou que querer levar para o Governo todos aqueles que já lá tinham estado com os resultados que se conhecem. À força de repetição, a retórica barrosista do despesismo público do PS colheu na opinião pública e é hoje, talvez, o único argumento de jeito que Santana tem para esgrimir. Guterres e os seus acólitos são o "rosto" desse "tempo". Aparecer duas vezes numa semana ao lado (ou abaixo?) de Guterres e convidar os guterristas para todos os jantares de campanha é o pior que Sócrates pode fazer pelo seu próprio futuro. Provavelmente não chega para lhe tirar a vitória, mas pode servir para o impedir de chegar à maioria absoluta (se é que pode lá chegar de qualquer modo).